Devaneios de um fumante

por cesargatto

cigarro

Não importa onde ou quando, uma pausa para o cigarro é uma necessidade. Um vício que vem desde os primórdios de uma vida breve. Um alimento tóxico, porém saboroso, que chega ao pulmão que pede trégua, que implora por aquele ar puro do interior, em vão.
Tomou seu banho e foi direto na varanda tragar seu passatempo. “Preciso ligar para os meus amigos, faz anos que não os vejo. Mentira. Os vi hoje mesmo nas redes sociais. Eles parecem estarem bem. Não foram eles e nem eu que sumi, a vida que passou e os levou, cada um pro seu destino, cada um com seu motivo. Mas uma curtida pra cá, outra acolá, dá uma falsa sensação de que estão todos próximos. Tem os colegas do trabalho também, mas não é a mesma coisa. Eu não os escolhi. Desconfio de quase todos. Há, inclusive,  aquela moça que conheci pela internet. A gente ficou duas vezes e agora fico naquele jogo de atenção: será que mando mensagem agora ou depois? Esse jogo de expectativas bagunça minha cabeça. Talvez se eu mandar depois não dê a entender que estou obcecado, nem estou, mas e se ela pensar que estou? Isso é um problema? Banal, diga-se de passagem. Quero voltar a fazer terapia e contar meus podres para alguém de confiança que não seja eu. Tenho certeza que pelo menos dois terapeutas com quem passei debochavam de minhas inseguranças em mesas de bar. Não os julgo, talvez eu fizesse o mesmo. Mas a última tenho certeza que não, ela era um doce, muito especial. Tenho tantos sonhos a serem realizados, mas se esfarelam pelos dedos quando o assunto é dar o mais difícil passo, o primeiro. Não fosse o amanhã, que dia agitado hoje seria. Logo estarei velho e com certeza me arrependerei, mas o que eu posso fazer hoje? Lamentar? Correr atrás? Estar aqui sentado vendo a fumaça dançar no céu sem vento é tão prazeroso. Lá se foi mais uma geração de minha família. O tempo voa é pleonasmo. Já estou na pré-derradeira geração. Vários fios brancos no cabelo já dão as caras, percebi algumas discretas rugas também, principalmente quando sorrio. Mas e lá na frente? Quem cuidará de mim? Não pretendo ter filhos e não quero ser abandonado num asilo à própria sorte. Pensar no futuro me deixa angustiado. Quer saber? Vou acender mais um cigarro pra viver hoje e morrer amanhã.”